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Sabe o que é o sistema Panhard?

Do "Système Panhard", à "barra Panhard", passando pela criação da primeira caixa de velocidades, este construtor francês desconhecido de muitos, estabeleceu os parâmetros essenciais do automóvel tal como o conhecemos.

É comum lermos, ainda hoje, um ensaio de um automóvel como o Mazda MX-5 e vermos o autor elogiar a opção pelo formato que se considera "ideal" para um desportivo: motor longitudinal com caixa de velocidades acoplada directamente e transmissão de potência às rodas traseiras.

Há quem lhe chame "transmissão clássica", mas a verdadeira definição, quase esquecida no tempo, é "Système Panhard". E porquê? Porque os geniais Émile Levassor e René Panhard, foram os primeiros a entender, e a colocar em prática, as vantagens do posicionamento do motor na dianteira do automóvel, com transmissão ao eixo traseiro.

Tudo começou com um casamento.
Originalmente, a Panhard era conhecida pelo nome dos seus dois criadores: Panhard et Levassor. Fundada em 1887, a marca apenas lançaria o seu primeiro automóvel em 1890, com base num motor Daimler.

Levassor obteve a licença de utilização da tecnologia Daimler através do advogado Edouard Sarazin, que era representante legal de Gottlieb Daimler em França. Após a morte prematura de Sarazin, seria a sua mulher Louise, a responsável por finalizar o acordo de licenciamento. Misturando trabalho com prazer, Louise e Émile Levassor, não tardariam a casar-se.

Com isto, Levassor estreitou relações com Gottlieb Daimler e os dois visionários acabariam por colaborar e partilhar ideias. Foi assim que, em 1892, surgiria o primeiro Panhard et Levassor com motor à frente. Mas esta seria apenas a primeira das grandes inovações da marca.

O nascimento da caixa de velocidades
Mas em 1895, o construtor francês daria um outro passo tão ou mais importante na evolução do automóvel, ao criar a primeira caixa de velocidades, com duas relações e marcha-atrás, tudo com transmissão por corrente. Tudo isto num veículo de quatro rodas, numa época em que muitos construtores ainda exploravam a possibilidade de usar apenas três.

O caixa de velocidades Panhard et Levassor passou mesmo a ser comercializada isoladamente, para ser utilizada por outros construtores, e estabeleceu o "standard" das transmissões, até 1928, altura em que a Cadillac apresentava a primeira caixa de velocidades sincronizada.

Mas a genialidade da marca Parisiense não ficou por aqui e continuaria a ser pioneira em várias soluções técnicas. 
 

A aerodinâmica e a posição de condução central
Em 1936 seria lançado o revolucionário Panhard et Levassor Dynamic, um modelo que se distinguia de quase todos os outros automóveis da época pela carroçaria aerodinâmica, com faróis embutidos nos guarda-lamas e escondidos atrás de grelhas.

Movido por motores de seis cilindros, o Dynamic seria um dos primeiros automóveis do mundo com carroçaria monobloco.

Seria também um dos primeiros a montar suspensão dianteira de triângulos sobrepostos, ancorados no motor, que funcionava assim como uma parte da estrutura, à semelhança do que acontece com alguns super-desportivos actuais.

Aquilo em que o Dynamic foi, definitivamente, o primeiro, foi na colocação de três lugares dianteiros, com o condutor ao centro, 57 anos antes do McLaren F1. À época, a solução era particularmente conveniente, porque os construtores e os condutores franceses estavam ainda num gradual processo de transição para o volante à esquerda. Contudo, pelo incómodo que representava aceder ao lugar central, em 1939 a solução foi abandonada, e o Dynamic passou a montar volante à esquerda.

A célebre "barra Panhard"
Houve ainda uma outra inovação que permitiu à Panhard um lugar permanente no léxico da tecnologia automóvel, que é a "barra Panhard". Esta solução, que tem tanto de engenhosa como de simples, surgiu no início do século XX e tornou-se especialmente relevante quando as suspensões de eixo rígido passaram a recorrer, cada vez mais, a molas helicoidais. Nesse caso, as forças exercidas em curva ou em pisos irregulares, podem forçar o eixo traseiro a mover-se lateralmente e a desalinhar-se relativamente às rodas da frente. As consequências mais evidentes são alguma imprecisão no comportamento e um maior desgaste dos pneus. A barra Panhard, fixa-se ao chassis e obliquamente ao eixo, o que permite travar deslocações laterais sem travar o movimento vertical. 
A barra Panhard, apesar de ter sido sucedida por soluções mais complexas e eficazes como a ligação Watts, ainda é aplicada em alguns automóveis, especialmente nos todo-o-terreno.

O sucesso na competição
Nos anos 50 a Panhard notabilizou-se por desenvolver vários modelos muito ligeiros e aerodinâmicos com que competiu em Le Mans, sendo vários anos vitoriosa no "Index of Performance", prémio calculado através de um rácio entre a distância percorrida em prova e a cilindrada.

A Panhard, enquanto construtora de automóveis ligeiros, extinguiu-se em 1967, sendo absorvida pela Citroën. O derradeiro modelo foi o Panhard 24. Posteriormente, a divisão de veículos blindados continuou em actividade até que em 2012 foi absorvida pela Renault Trucks Defense, empresa então pertencente ao Grupo Volvo.

Para os entusiastas mais jovens, o nome Panhard pode parecer uma mera nota de rodapé, mas aqui se prova que o contributo que teve na evolução do automóvel foi maior do que os de alguns gigantes industriais.