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Injustiçados
: Alfa Romeo Alfasud Berlina

Por vezes, defeitos mediáticos condenam modelos virtuosos. Vamos fazer justiça ao Alfa Romeo Alfasud.

Quando alguém diz que sonha com um Ferrari ou Lamborghini clássico, será que está disposto a viver com todos os custos e complicações que isso acarreta? Estará disposto a viver com os custos de manutenção, com as eventuais avarias? É provável que esteja. O carácter e a experiência de condução desse tipo de carro justifica em grande parte o sacrifício. É o preço a pagar por ter algo que é exclusivo. O feeling, os cheiros, a estética e o “toque latino” são inimitáveis e altamente desejáveis. Se tudo isto é verdade quando falamos de carros de valores muito altos, porque não há-de ser verdade para um Alfasud? É um carro mau? Tem seguramente muitos defeitos, mas vale a pena contextualizar o nascimento para começar a ter compaixão. No final dos anos 60 e inícios de 70, o Sul de Itália atravessava uma forte crise. Com toda a indústria e finança concentrada no Norte do país, o Sul mantinha-se essencialmente rural, com níveis de formação e desemprego verdadeiramente alarmantes. Quem também vivia uma crise interna, em Milão, era a Alfa Romeo. Depois de alguns anos menos felizes e de uma gestão tipicamente latina, o estado acabou por intervir para salvar a empresa, passando a deter boa parte do seu capital. Para esta ajuda havia, no entanto condições e contrapartidas. Uma delas foi a abertura de uma unidade industrial no Sul do país, que permitisse empregar boa parte daquela população desocupada.

A ideia parecia boa, mas como é habitual nas soluções de recurso, os pormenores haviam de ser críticos. O principal problema estava na falta de formação dos novos operários, na sua maioria ex-agricultores, sem a literacia, o rigor ou o ritmo de trabalho que a actividade industrial exigia. Isso afectaria gravemente a qualidade de construção. Outro facto não ponderado foi o clima húmido do mediterrâneo. O tratamento de protecção de chapa não era suficientemente bom para lidar com aquelas condições ou era aplicado tardiamente, principalmente quando as greves ou a ineficiência levavam as carroçarias a permanecer por muito tempo ao ar livre entre diferentes fases de montagem. A contribuir para a má fama do Alfasud esteve também uma das suas maiores virtudes: o motor de cilindros opostos foi concebido por Rudolf Hruska, que havia trabalhado na Volkswagen durante o desenvolvimento do motor do Carocha e derivados. Hruska era um fã da solução, porque esta permitia um centro de gravidade ideal e uma linha de capot mais baixa. Mas o carácter nervoso e a necessidade de uma utilização vigorosa para que a afinação automática funcionasse devidamente, criaram uma reputação negativa para um excelente motor com elevada potência específica. Mas os encantos do Alfasud não terminavam aqui: a caixa de cinco velocidades tinha um selector de curso longo, mas preciso, e o escalonamento era excelente para tirar partido dos pequenos motores. O comportamento era o mais próximo que se podia chegar da delicadeza e agilidade de um Giulia, mas com transmissão dianteira. Era o mais divertido familiar da sua geração e, na versão com portão traseiro ou Giardinetta (carrinha), era também um automóvel prático e competente. Continuam a existir muitos Alfasud Sprint bem conservados, mas de desejar fazer justiça a um Berlina, prepare-se para lidar com ferrugem. Muita ferrugem. Mas no final, terá nas mãos um pedaço de história divertido de guiar, raro e cheio de carácter.