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Estrelas da TV nacional #1

Recentemente recordámos as estrelas das grandes séries de TV internacionais. Agora é a vez dos que brilharam nas produções nacionais. Com menos luxo e cachet a condizer.

Fotos: Scoutsource Communication, RTP, arquivo

Portugal é um país onde não há escassez de talento artístico. Isso é visível em todos os terrenos da criação, inclusive nas séries televisivas. Não ficamos a dever nada às grandes produções internacionais naquilo que é matéria humana: temos bons artistas, bons produtores, bons realizadores e até actrizes giras para quando faltam outros pontos de interesse.

Há, no entanto, algo que nos falta: orçamentos chorudos e marcas de automóveis interessadas em oferecer carros novos e reluzentes para usar em perseguições potencialmente perigosas. Principalmente nas séries mais antigas, não havia carros a saltar, não havia polícias a empurrar ladrões para fora da estrada, explosões nem pensar e sexo em cima do capot, só com jeitinho.

No fim das séries, os carros voltavam para os donos e continuavam a sua vida fora dos holofotes, portanto, convinha não estragar nada. E também convinha que fossem carros baratos para não haver imprevistos dispendiosos. Talvez isso explique os estranhos “castings” de automóveis de algumas séries, em que os modelos pareciam não bater certo com as personagens que os guiavam.

Havia polícias de Peugeot 504 Break e gente abastada com motorista privado num Citroën BX. Com carros deste calibre para guiar, não é de estranhar que actores e realizadores preferissem cenas de estúdio, onde estavam a salvo de avarias, intoxicação por inalação de fumos e acidentes por problemas de manutenção.

Apesar dos automóveis serem quase sempre relegados para papéis secundários, existiram algumas séries nacionais em que os modelos usados serviam para caracterizar as personagens que os guiavam. Mesmo nesses casos, a caracterização nunca era elogiosa, porque a qualidade dos automóveis variava entre o modesto e o lamentável. Como acontecia com o Citroën 2CV da equipa de detectives trapalhões de Duarte & Companhia ou com o Bedford Rascal do empresário aldrabão e falhado de “Fura-vidas”, interpretado por Miguel Guilherme.

Com ou sem intenção de depreciar as personagens, os carros das produções televisivas nacionais raramente nos faziam sonhar. Apesar disso e, à semelhança do que acontece com a vida real, alguns desses carros banais e humildes ficaram marcados na nossa memória. Vamos recordar cinco modelos e as histórias que os rodeavam.

Borgward Isabella TS Convertible 1954-1962

Porquê este modelo?
Grande parte das séries policiais de sucesso norte-americanas transportam o espectador para o imaginário dos anos 40 e 50. Ambientes onde até os bandidos são elegantes e em que se usa sempre um chapéu de aba e uma gabardine. Os detectives são sempre soturnos e solitários à excepção das ocasionais aventuras com mulheres sedutoras e geralmente mal-intencionadas (como muitas da vida real).

Portugal era demasiado sereno nessas décadas para grandes aventuras policiais mas, mesmo assim, António Pinho e António Cordeiro partiram para a criação de uma série protagonizada por este último e baseada no género “gangster”.

Para veículo do sorumbático e introspectivo detective havia que arranjar um carro de linhas ao estilo americano. O Borgward Isabella foi o que se arranjou. É improvável que o aderecista soubesse que o modelo era na verdade alemão, com desenho inspirado pelos modelos americanos mas, por sorte ou não, acabou por fazer uma escolha acertada.

Infelizmente, nas cenas em que Claxon aparecia ao volante nas ruas de Lisboa, nunca ninguém tentou disfarçar os carros modernos que apareciam em segundo plano.

O que procurar

Claxon era um detective de extraordinária eficiência e profissionalismo, mas também errava de vez em quando. O Isabella era semelhante.

Devido a alguma urgência na passagem à produção, as primeiras unidades apresentaram alguns problemas de fiabilidade. Apesar disso, o Borgward era um modelo com qualidades suficientes para se posicionar como uma alternativa a um Mercedes-Benz 180 “Ponton”, apesar de ser vendido a um preço muito inferior.

Graças à construção monocoque e a uma boa suspensão, o Isabella oferecia uma condução equilibrada, apoiada por um poder travagem muito elogiado na época.

O motor de apenas 1,5 litros era adequadamente potente e económico, com prestações superiores aos Opel Rekord e outros modelos do segmento. O motor de 60cv equipava os modelos Sedan e Combi.

Em 1955 foi lançado o modelo Cabriolet, com motor de 75cv. Essa mecânica viria a ser adoptada também pelo elegante Isabella Coupé e mais tarde daria origem às versões Sedan TS e Combi TS.

Confortáveis, espaçosos e com um habitáculo luminoso, os Borgward gozaram de muita popularidade mas, apesar disso, a empresa faliu. Diz-se que terá havido um conluio a favor da BMW através de um gestor nomeado pelo estado com assento no conselho de administração de ambas as empresas. Nunca ficou provada essa conspiração, porque o detective Claxon estava ocupado.

Para que serve
Neste artigo, serve para compensar as desgraças que se seguem. Como clássico, serve para recordar que mesmo os alemães sabem ser mafiosos. É um bom automóvel para bons passeios em família com conforto, estilo e fiabilidade.

Perfil do "actor"
Com o seu estilo “americanado”, o Borgward é como um daqueles artistas nacionais que conseguem um papel secundário num filme estrangeiro, com apenas duas falas, e quando voltam estão com um sotaque cerrado.

Alternativa
Um dos actores a melhor representar o papel de detective numa série nacional, era um pastor alemão. “Inspector Max” (“primo” sem pedigree do alemão “Rex, o cão polícia”) escolheu para seu transporte um Range Rover Classic, guiado por um motorista com talento duvidoso.

Motor: 4 cil. Em linha; posição longitudinal dianteira; árvore de cames lateral; 1493cc;
Carburador Solex; 75cv às 4500 rpm; Transmissão: traseira; 4 Vel. Man;
Travões: à frente, de tambor; atrás, de tambor. Sem servofreio;
Chassis: monobloco em aço de 2 portas e 4 lugares;
Comprimento: 4343mm; Distância entre eixos: 2616mm; Peso: 1000kg;
Velocidade Máxima: 150km/h

Utilização 4
Manutenção: 2
Fiabilidade 4
Valorização 2