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Um “top 10” do Madeira Classic Car Revival

De 23 a 25 de Maio aconteceu mais uma edição do Madeira Classic Car Revival, uma organização grandiosa e em constante evolução. Eis os dez destaques deste evento.
Hugo Reis
4 de jun. de 2025

Fotos: Clube de Automóveis Clássicos da Madeira

Não vale a pena tentar convencer os leitores de que somos diferentes de qualquer turista continental. Mesmo que não houvesse automóveis, não seria preciso muito para nos convencer a ir à Madeira passar uns dias. Se nos fosse proporcionada uma dieta rigorosa de bifes de atum, espetadas, bolo do caco e poncha, passariam semanas até que começássemos a sentir saudades de ver automóveis e de conduzir. 

No entanto, se lhe disser que a “ementa” do Madeira Classic Car Revival é de tal modo suculenta que faz esquecer as mais tradicionais iguarias, estou certo de que ficará surpreso (especialmente se souber o quanto gosto de comer). 

Desde há dez anos que tenho a honra de ser convidado pela organização para integrar o júri do concurso de elegância. Já fui jurado nas categorias de elegância, restauro e, este ano, na categoria de originalidade/preservação.

O evento, ao longo destes anos, mudou de nome, de local, de configuração e formato e até foi rodando a equipa, mas o essencial manteve-se: um cuidado extraordinário com a estética e os detalhes, a inclusão do público, a animação constante e o facto de servir como um extraordinário postal ilustrado da Madeira. 

Para melhor ilustrar o que faz deste evento algo de tão especial, optei por destacar dez aspectos desta edição.

A quantidade!
Num primeiro momento, o que choca quem visita este evento pela primeira vez é o número inacreditável de veículos em exposição. E quando falámos de veículos, convém sublinhar que 95% são automóveis.

Nos últimos anos, devido às obras na marginal, o espaço reduziu-se e o número de participantes está limitado, mas em edições anteriores foi possível contar cerca de 500 automóveis!

Mesmo em 2025, fui abordado mais do que uma vez por turistas estrangeiros que me perguntaram: “Mas estes clássicos todos de onde vêm? Não podem ser todos da ilha...” A verdade é que são...

O paraíso dos automóveis “banais”.
Embora grande parte dos automóveis em exposição sejam modelos tradicionalmente coleccionáveis, nomeadamente desportivos, a verdade é que para se chegar a este número, muito contribui o facto dos madeirenses manterem com muito carinho, automóveis que nada têm de extraordinário... até serem raros!

Parte desta cultura de preservação é resultado da insularidade e do território relativamente pequeno, com os veículos a somarem menos quilómetros ao longo da vida. Por outro lado, é também uma certa filosofia herdada dos ingleses, cuja forte presença na ilha ao longo da história, moldou este respeito pelo passado.

É fascinante andar pela ilha e ver o número de automóveis com 30 e 40 anos a serem utilizados no quotidiano, e em perfeito estado de conservação. Isso tem um reflexo na exposição, que contém dezenas de modelos que de tão banais se tornaram esquecidos e agora, são uma atracção fantástica deste evento. 

Onde mais é possível encontrar um Peugeot 505 com 28.000km? E um 304 de quatro portas incrivelmente bem conservado? E um comum Toyota Corolla sedan de inícios dos anos 80, com o tecido dos bancos original e impecável e uma pintura perfeita? 

Ainda bem que alguém se dedica a proteger modelos que, de outra forma, caíriam no esquecimento. 

As raridades
Mas nem só de coisas humildes e simples se faz o encanto do movimento dos clássicos na Madeira e o nível dos modelos trazidos ao longo dos anos para a ilha, revela a profundidade da cultura automóvel dos coleccionadores Madeirenses. 

Alguns exemplares já são famosos, como é o caso do Abarth Scorpione ou do irreverente Sovam Coupé Sport 1100A, um desportivo francês baseado em componentes Renault. No extremo oposto, está um imponente Facel Vega HK500 que tem trazido sempre elegância ao evento, ou mesmo peças mais exóticas que no passado foram surgindo, como um Stanguellini de Fórmula Júnior.

A qualidade dos restauros
Se é verdade que muitos automóveis chegam à ilha restaurados ou saem da ilha para receber os tratamentos de que precisam, não é menos verdade que a grande maioria dos automóveis em exposição e até a concurso, são recuperados na Madeira. 

Sendo certo que a necessidade aguça o engenho, é natural que um território insular desenvolva alguns bons especialistas. No entanto, o nível de alguns restauros está em linha com o que de melhor que se faz pela Europa fora e isso é notável. 

Este ano, na “short-list” do prémio de restauro estavam um Austin A40 Devon e um BMW 1502, com um nível de acabamento invulgar para automóveis deste calibre popular. O prémio “Best of Show”  acabaria por recair num belo Ford V8 Roadster de 1934. 

Os veículos convidados
Como forma de animar e fazer variar o “rosto” do espectáculo, o Clube de Automóveis Clássicos da Madeira tem vindo a convidar automóveis relevantes do continente para marcar presença no evento. 

Entre eles já estiveram, por exemplo, o Singer 9 Sport que já venceu no circuito da Boavista, o Felcom, modelo português criado por Eduardo Ferreirinha, ou mesmo o Lamborghini Miura SV do Museu do Caramulo. 

Este ano, o Museu foi novamente convidado a trazer algo de especial e a escolha recaiu no elegantíssimo Bugatti Type 57 Stelvio, com a exuberante carroçaria Gangloff. Também do Caramulo foi a réplica oficial do Benz Dreirad de 1886, que fez furor nos momentos em que foi conduzido por Pedro Filipe na Avenida do Mar.

Do Norte, pelas mãos da família Patrício Correia, veio mais um automóvel nacional de grande relevo, o ágil Olda, pequena “barchetta” construída em Águeda nos anos 50, com mecânica Borgward em plataforma Fiat 1100.

Os figurantes e animadores
Um evento de clássicos, sobretudo se pretende captar novos públicos, tem de ser muito mais do que veículos estacionados. O Clube de Automóveis Clássicos da Madeira tem essa percepção e, por isso, todos os anos tem como um dos seus “ex-libris” a presença de figurantes vestidos em estilo “vintage”. 

Mais do que apenas “corpo presente” estes profissionais alinham numa certa encenação, nas poses e nas interacções que dão um belíssimo colorido ao evento e proporcionam imagens muito belas, tanto para os jornalistas como para o público em geral, que pede para se fotografar junto com os figurantes e assi guardar recordações únicas. 

Neste contexto, destaque ainda para o sinaleiro. Para quem conhece o evento, desde o seu início que a figura do sinaleiro, sempre de apito em punho em interacções muito divertidas com o público é parte do espectáculo. Este ano, pela primeira vez, o “actor” mudou, mas não deixou de ser uma performance divertida e enriquecedora, em particular no slalom da Rampa dos Barreiros. 

A hospitalidade e o entusiasmo 
Para um evento deste género manter uma certa aura e envolver tantos participantes, é fundamental que haja da parte da organização muito mais do que trabalho. 

A equipa do Clube de Automóveis Clássicos da Madeira tem um entusiasmo desmedido, que se revela em cada minuto e que se comprova quando, mesmo após os normais momentos de pressão e no final de longuíssimos dias de trabalho, os sorrisos de orelha a orelha são constantes. 

É uma equipa extraordinária esta liderada actualmente por Miguel Gouveia, em que todos são verdadeiros entusiastas. O mesmo se pode dizer da Secretaria do Turismo, que torna este evento possível e onde todos os envolvidos revelam um entusiasmo enorme pelo Madeira Classic Car Revival, como ficou provado pelo facto de todas as senhoras da secretaria terem, este ano, decidido apresentar-se vestidas à época, para emprestar ainda mais um toque de elegância ao evento. 

Além disso, numa face que só é perceptível por jornalistas, convidados e participantes, a hospitalidade da equipa que torna possível este evento, seja a Secretaria Regional de Economia Tursmo e Cultura, seja o Clube, são exímios na arte de receber, tornando cada minuto da estadia em algo especial. 

A Rampa dos Barreiros
Sem movimento, os automóveis não têm a mesma magia e, por isso, a conjugação da exposição e concurso de elegância com a prova de regularidade, resulta muito bem. 

Na manhã de domingo, 57 máquinas alinharam-se para percorrer o traçado histórico desenhado nas ruas do Funchal, para alegria do imenso público que se junta nos passeios, jardins e varandas.

Este ano, para acrescentar beleza ao acontecimento, a vitória foi para uma dupla feminina composta por Júlia Barros e Patrícia Gouveia, num Mercedes-Benz 280 SL (R107). 

A estreia dos supercarros
Podem não ser o propósito de um evento chamado Madeira Classic Car Revival, mas os superdesportivos foram uma excelente novidade no evento deste ano. Embora colocados num pontão, atrás do espaço destinado aos Porsche, 

Na nossa opinião, é algo que se enquadra na perfeição, pois não só estes são automóveis clássicos desde o dia em que nascem, pela sua exclusividade e tecnologia, mas também porque, no futuro, serão os que ocupam o “palco principal”.

Mais relevante ainda, é o facto de estes modelos atraírem um público jovem, que é aquele que se quer captar para estas actividades, pois serão os que virão a assegurar a continuidade.

O exemplo para o resto do país

Por último, continua a encantar-nos o facto do Madeira Classic Car Revival ser um brilhante exemplo para regiões e autarquias de todo o país. A projecção, a beleza e o impacto deste evento, provam que os automóveis clássicos podem ser um grande motor do turismo. As imagens geradas por este fim-de-semana e a surpresa que causa nos turistas presentes, potencia a atractividade da Madeira.

Além do mais, é uma forma de divulgação de um património da ilha. Note-se que, no Governo Regional, há também uma admirável tradição de manter, restaurar e expor os veículos que ao longo das épocas foram servindo os organismos da ilha. Contribui para a causa o facto de Eduardo Jesus, o Secretário Regional do Turismo e Cultura, ter sido um dos mentores do evento, na sua génese, em 2012.

Aplaudindo o bom exemplo, esperamos que se mantenha por muitos e muitos anos e que a ideia contagie algumas autarquias do país, já que o investimento necessário não é relevante quando considerado o impacto. 

Parabéns a todos aos organizadores, aos participantes e aos madeirenses em geral.