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Hambúrguer com esparguete

Fã de carros italianos, Lee Iacocca viu em DeTomaso um aliado perfeito para inaugurar um novo segmento de mercado nos Estados Unidos e dominá-lo por completo. Foi quase um sucesso.
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23 de out. de 2024

Fotos: Petersen Automotive Museum / Motorclassics.com 

Mesmo numa época em que os construtores de desportivos pululavam em cada esquina, o DeTomaso Mangusta criou impacto no público aquando da sua apresentação. Especialmente em Iacocca, bem atento aos passos dos clientes. O carismático líder da Ford pretendia reforçar a posição dominante do grupo em todos os segmentos de mercado. Depois das tentativas falhadas de aquisição da Ferrari, Iacocca viu na DeTomaso uma solução bem lógica para as suas ambições: ali estava uma marca com um DNA puramente italiano mas que usava os mesmos motores a que a rede de concessionários Ford estava habituada a dar assistência. Os DeTomaso poderiam assim ser tratados como qualquer outro modelo da gama, quer em termos de assistência, como de garantias. Desta feita, não houve propriamente tentativa de aquisição da marca, mas antes uma compra dos direitos de distribuição daquele modelo. Iacocca já tinha percebido, da pior forma, que o orgulho de um empresário latino (especialmente dos ex-pilotos) não se vergava, nem se vendia com facilidade. A aliança com a Ford seria, para Alejandro DeTomaso, simultaneamente uma oportunidade e um elogio. Para a marca americana, era uma forma de estrear a presença naquele segmento, mantendo os riscos em níveis razoáveis.  

Embora o Mangusta tivesse sido recebido com entusiasmo, a reputação de má qualidade de construção afectou desde logo as suas ambições. Por isso, para efectivar esta aliança era preciso que o carro fosse reformulado, para resolver defeitos de engenharia e também para tornar evidente a mudança. O plano passava por uma actualização do Mangusta, mas com a injecção de capital, DeTomaso foi bem mais longe. O Pantera introduzia assim o chassis monobloco e uma carroçaria totalmente nova. Do ponto de vista de marketing, era relevante a chancela do design italiano. O estúdio Ghia foi por isso o eleito mas, paradoxalmente, o autor do desenho acabaria por ser americano. Tom Tjaarda trabalhou na Ghia e na Pininfarina, tendo sido criador entre outros, das linhas do Ferrari 365 California, do Fiat 124 Spider e do Ford Fiesta MkI. 

O projecto estava a ser construído com todos os passos certos mas, ao mesmo tempo, havia que lidar com a pressão do tempo: 
Iacocca tinha ouvido rumores de que a AMC se preparava para lançar o AMX e de que a Chevrolet estava a estudar o lançamento de um Corvette também com motor central. No seu entender, em qualquer negócio ou segmento de mercado, o mais importante era ser o primeiro a chegar, por isso, pressionou imenso Alejandro De Tomaso. Entre a ideia e a apresentação do Pantera, passaram apenas nove meses. Uma gestação curta para um automóvel, sobretudo se pensarmos que se tratava da primeira tentativa de produção de um super-carro para as massas. O Pantera seria distribuído através dos concessionários Lincoln, e vendido a cerca de 10.000 dólares. Para contextualizar, um Corvette custava 6.000 e o mais acessível dos Ferrari cerca de 20.000. Estes valores faziam do Pantera um exótico relativamente acessível, sem qualquer rival directo. 

Iacocca era fã dos carros italianos e acreditava que tinha conseguido uma fórmula perfeita para convencer os americanos a render-se a este tipo de carro. Havia no entanto coisas típicas de um super-carro a que aquele mercado não estava habituado: primeiro, a falta de espaço e o lado pouco prático de um desportivo de motor central; em segundo problemas de fiabilidade típicos deste género de carro. O pouco tempo de desenvolvimento fez com que as primeiras 700 unidades do Pantera chegassem aos concessionários com imensos defeitos de concepção e de qualidade. A produção era feita integralmente em Itália, em processos manuais muito pouco adaptados à urgência de uma pequena produção em massa. As reclamações começaram desde logo a surgir e os mecânicos da rede Lincoln não apreciavam nada ter de trabalhar numa baía de motor mais congestionada do que o habitual. 

O Pantera continuava a ser um super-desportivo muito mais fiável e barato de manter do que os rivais italianos da Ferrari ou Lamborghini. No entanto, os clientes americanos que compravam os Pantera a 10.000 dólares não tinham esse termo de comparação. Estavam acostumados aos simples e fiáveis Mustang, Corvette e Camaro e, por isso, não tinham paciência para os problemas de temperamento e juventude do Pantera, como o aquecimento do motor e as constantes falhas eléctricas. 
Como sempre, Iacocca reagiu rápido e contratou as oficinas West Coast do piloto Ford Bill Stroppe, para efectuar as necessárias melhorias no modelo. Em 1973, o Pantera tinha já ultrapassado a maioria dos seus defeitos com upgrades simples, que podiam mesmo ser adaptados a posteriori nos carros vendidos anteriormente. Mas o mal estava feito e a reputação de carro problemático era difícil de desfazer. 

A braços com crescentes restrições ambientais e de segurança, tornava-se difícil para a Ford continuar a comercializar o modelo. Primeiro foi necessário usar uma versão do Cleveland com taxa de compressão mais baixa e menos de 250cv, para conseguir cumprir o limite de emissões. No futuro, anunciava-se a necessidade de redesenhar toda a frente, para cumprir com as normas de protecção em caso de embate, o que significaria um investimento grande. Assim, no final de 1974, a Ford desiste do Pantera. 
Alejandro De Tomaso passa a importar motores oriundos da Austrália e a produzir o Pantera em diferentes versões. Com algum trabalho de preparação realizado na Suiça, os Cleveland usados tinham até 355cv. Em 1980 o chassis sofreu evoluções. Nasce então GT5, com vias alargadas, com extensões em fibra de vidro, abas laterais e spoiler dianteiro, e em 1985 o GT5-S, com um aileron igual ao do Lamborghini Countach. O interior foi evoluindo e recebendo refinamentos.
Em 1990 dá-se a derradeira evolução, com um redesenho da autoria de Marcello Gandini e um motor Ford Windsor de 5000cc. 
A suspensão foi igualmente reformulada. Deste modelo, chamado Pantera Si, foram fabricadas apenas 38 unidades, havendo informação de quatro unidades com tejadilho “tipo targa”. Em 1993, a produção foi oficialmente encerrada.