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Personalidade: Gabriel Voisin

Peter Mullim chamou-lhe “Leonardo da Vinci do séc. XX”. A julgar pelos seus feitos e criações, talvez não seja um exagero

Seria injusto dizer que foi um industrial ou um engenheiro. Muito menos um empresário. Gabriel Voisin era um apaixonado pelo design, pela engenharia e pela mobilidade. Era, tal como o descreve Peter Mullim, o mais próximo que se poderia chegar ao ideal de homem do Renascimento, tal era a diversidade das suas virtudes. Devido à rivalidade entre os EUA e França, os irmãos Wright são frequentemente creditados como os grandes pioneiros da aviação e os autores do primeiro voo pilotado. 

Contudo, a verdade é um pouco diferente. Muito embora os irmãos americanos houvessem patenteado, em 1906, uma solução que permitiria controlar um avião em voo, seria uma criação de Voisin a realizar o primeiro voo completo e controlado em 1908. O piloto foi o destemido Henry Farman que bordo de um dos biplanos Voisin, realizou um voo de mais de 1km, com a duração de 1m28s, em que conseguiu descolar e aterrar no mesmo ponto. 

Ciclista, piloto da Renault e um aventureiro por natureza, Farman fez amizade com Voisin quando ambos frequentavam a Faculdade de Belas Artes de Paris. A frequência desta escola terá sido determinante na criação da personalidade única de Gabriel. A formação artística permitiu-lhe adquirir uma sensibilidade estética apurada e a ambição de realizar criações memoráveis e grandiosas, como as dos grandes mestres da pintura, escultura e arquitectura. 

No fundo, Voisin expressava-se através das suas criações funcionais. Os seus automóveis, tal como os aviões, expressavam um fascínio pelo futuro. Uma urgência no avanço da técnica que, naquela época, apenas os seus rivais franceses pareciam partilhar. Leveza, aerodinâmica, segurança, fiabilidade, economia e bom comportamento eram as seis premissas fundamentais da indústria aeronáutica que Gabriel Voisin considerava que teriam de ser transportadas para os automóveis. 

Uma das soluções ensaiadas foi mesmo a utilização de um motor radial, à semelhança daqueles usados em aviões. O objectivo seria usá-lo num projecto a que Gabriel chamou “Carro do Futuro” e que incluiria chassis monocoque e suspensão independente às quatro rodas. O desenvolvimento foi abandonado quando a situação financeira da empresa começou a degradar-se.

As soluções técnicas avançadas e exclusivas de alguns modelos Voisin eram desenhadas quase sempre pelo próprio, excepção feita à época em que o amigo André Lefebvre era seu empregado. Ambos partilhavam a mesma visão sobre o futuro do automóvel, questionando todas as convenções e procurando, sempre que possível, partir de uma folha em branco. Lefebvre apenas deixou para trás a Voisin quando as primeiras dificuldades financeiras surgiram. 

Gabriel terá visto a sua partida para a indústria “mainstream” com bons olhos, regozijando-se com a possibilidade de ver algumas soluções que ambos idealizaram em conjunto a ser postas em prática em carros produzidos em larga escala.

Quando o designer Andre ‘Noël-Noël’ Telmont deixou a empresa pelas mesmas razões que Lefebvre, Voisin assumiu também a responsabilidade pelo desenho das carroçarias. É precisamente a partir de então que os carros Voisin começam a assumir formas mais dramáticas, aerodinâmicas e irreverentes, muito fiéis aos princípios da Art Deco. O compromisso entre forma e função era algo que tinha em comum com o seu grande amigo e arquitecto Le Corbusier.

No meio de toda a sua genialidade e compromisso com a excelência, Voisin optou por ignorar a visão de mercado. Antipatizava com Henry Ford pela visão economicista e simplista com que este abordava a indústria. 

Voisin acreditava que só valia a pena fazer carros para fazer o melhor e perseguir o futuro. O resultado foram produtos tecnicamente deslumbrantes, mas obscenamente caros, que apenas os seus fãs ou os mais excêntricos protagonistas da alta sociedade ousavam comprar. 

O desfecho, seria previsível: a fragilidade financeira levou a que a empresa fosse integrada no seu principal credor, o fabricante de motos e material militar Gnome & Rhône, que por sua vez seria nacionalizado durante a guerra.

A derradeira e mais popular criação de Voisin seria o microcarro Biscuter, totalmente produzido em alumínio e do qual foram fabricadas 12.000 unidades em Barcelona.

Gabriel Voisin seria condecorado como Cavaleiro Honorário da Legião Francesa pêlos seus feitos. Em 1960 retirou-se para a sua propriedade no campo, onde residiria até à sua morte em 1973, aos 93 anos.

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