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Uma Transit de 80.000€!

Está em excelente estado, tem enorme espaço de carga, mas dificilmente a vai encontrar na feira da sua terra. Este trabalhadora vai ter uma reforma dourada!

São muitos os entusiastas que reclamam, e com razão, mais visibilidade para os veículos de mercadorias históricos. Afinal, a maioria deles teve mais impacto social e cultural do que muitos veículos de passageiros.

Quem não se lembra da Citroën HY da peixeira, da Renault 4F dos CTT ou dos TLP, das Toyota Hiace dos merceeiros, das Morris Sherpa ou das Peugeot 504 usadas por quase todas as empresas?

Os comerciais Ford sempre tiveram uma forte presença na Europa, com a Transit à cabeça. Nascida em 1965, como sucessora das Taunus Transit e Thames, a Transit tinha um design de inspiração americana e era muito mais larga do que as antecessoras e que as suas rivais, o que lhe conferia um espaço de carga imbatível.

Para poder colocar o motor fora do habitáculo sem estender muito as dimensões da carroçaria, a Ford optou pelos V4 Essex e Cologne (Taunus), que eram muito compactos. Contudo, para adoptar as motorizações de seis cilindros e diesel, criou a carroçaria que seria apelidada de “nariz de porco”, assim chamada pela grelha protuberante e que seria a mais popular em Portugal, onde o gasóleo compensava.

O motor Diesel era, originalmente, um Perkins, mas as críticas face à performance e robustez levaram a que a Ford usasse o seu próprio motor York a partir de 1972.

Outra mais-valia da Transit era a multiplicidade de carroçarias, do furgão à pick-up, passando pelo mini-bus, auto-caravanas e afins. Mas uma das carroçarias mais apreciadas foi sempre o chassis longo de rodado duplo. Por alguma razão, os entusiastas associam automática os alargamentos do rodado duplo a algo de estranhamente desportivo. Mas há outra explicação…

Nos anos 70, antes da era dos grandes camiões e motorhomes, toda a equipa desportiva que se prezasse tinha uma Ford Transit de rodado duplo para puxar os seus automóveis de competição. Claro que isso inclui a mítica Diabolique. No caso concreto, era precisamente uma MkI longa, de rodado duplo e motor V4, com uma belíssima decoração, em linha com aquilo a que a equipa de Miguel Oliveira nos habituou nos modelos de competição

Há também o factor Transit Supervan… Num espectacular golpe publicitário, a Ford criou uma Ford Transit assente no chassis de um GT40, com o motor montado em posição central e sobrealimentado. O V8 5.0 deste “furgão-silhueta”, tinha cabeças Gurney-Weslake e debitava mais de 400cv. Quase tudo teve de ser redesenhado, incluindo a suspensão dianteira que recorreu a componentes do Jaguar XJ6. A Supervan apareceu pela primeira vez no Easter Race Meeting de Thruxton de 1971 e foi um sucesso mediático.

Apesar destas e de outras razões justificarem o magnetismo dos entusiastas face às Ford Transit, nunca ninguém adivinharia que em 2022 uma Transit poderia trocar de mãos por 80.000 euros! Não há engano. Foram 61.000 libras acrescidas de comissões e impostos que garantiram ao feliz (e um pouco doido) comprador levar para casa um exemplar que, admita-se, é muito especial…

Este exemplar é do face-lift da MkI, que chegou ao mercado em 1971 e que se distingue pela grelha mais pequena de cantos redondos. É de chassis longo e com rodado duplo, num bonito tom azul-claro. Segundo a leiloeira, este exemplar era um pedido de encomenda, pelo que tem características pouco comuns, como porta de carregamento lateral de ambos os lados, portão traseiro basculante (em vez de duplo de abertura vertical), bancos especiais de vinil perfurado e tablier com acabamento em vinil cor de madeira e caixa com overdrive. Está ainda equipada por um leitor de cartuchos de oito pistas e tampões especiais da época. A cereja no topo do bolo é o facto de marcar apenas 11.000km que se crê serem reais.

Tendo já sido premiada em alguns eventos, a Transit atraiu muitas atenções no leilão da Silverstone Auctions em que, aonde foi apresentada sem valor de reserva, para atingir esta cifra recordista, que deverá demorar muito tempo a superar.

É um acontecimento histórico que marca a passagem da Transit do estatuto de “princesa das feiras”, para “rainha dos salões”.